sábado, setembro 16, 2006

No repouso das mãos...



(pintura de J.M.Teles da Silva)*









Tal como de ti as vozes numa imensidão de azul se espalham
Tal como de ti reluzem as pradarias pela aurora orvalhada
Tal como de ti as estrelas cantam sobre um mar silenciado
E o vento os seres do deserto movimenta com seu passo apressado

Assim me mantenho e sustento
As águas trazidas pelo vento
A dor que se me aperta no peito
Pelas crianças estropiadas
Num abandono displicente
E planeado

Tal como de ti pressinto a escuridão dos dias planos
Tal como de ti modero o arrasto de incautos passos
Tal como de ti se me cortam do degelo as palavras
E avisto as folhas solitárias jorradas em brancas placas

Assim em incongruências nos vemos
Nos traços que a planura no espaço adensa
Na matemática geométrica dos braços
Como em súplica dos brilhos imensos
Que a terna Natureza qual criança
Serenamente, brincando, a si clama

E no repouso das mãos entrelaçadas
Desfiam-se contas de prata salgada….


* ( Agradeço ao pintor a autorização de publicar a imagem
cujo blog "sbrdvnt" se encontra nos meus links)

segunda-feira, setembro 11, 2006

Registos














Ouço-te num qualquer outro registo de dança
onde pensares e sentires são devolvidos em contracapa
nua, de cor única e vazia de espelhos

Olho-te e não te vejo.

Só os esboços estudados da dança
permanecem em meus ouvidos como inconstância
de desafios musicados
de suspiros
de muros levantados
e de búzios fendidos
por onde se escapa o que nem a brisa alcança

Olho-te por entre o arvoredo de um mar salgado
agitando formas de cotovelos apoiados nas águas
numa outra de mim que o registo fez parte
quando fendiam as paredes da casa
agora brancas, imaculadas,
pelo silêncio sorridente e ameno das asas
que descubro serenamente e destapo
nas cores luzentes das sonoridades
que enfeitam e alegram o espaço
no repouso cantante, suave,
do regaço que eleva e embala


(imagem de Pino Daeni)


Poema in "Transparência de Ser"

sábado, setembro 02, 2006

Sob o cuidado dos dias



















Reparte-se sob o cuidado dos dias
por onde flutua e caminha
em seus passos de dança

Reparte-se e não faz parte.
Divaga...
ao som da melodia clara
estremecida
nos seus braços de criança

E joga vida fora
com a leveza dos anos
Do Tempo não traz o momento,
nem enganos

E deixa que repartam seus cabelos
entre tranças, pendentes cachos,
ou em rabo-de-cavalo
com aquela fita luzente
que alvo bibe afaga
pelos folhos dos solfejos
ressoando pela sala

Parte-se e reparte-se
o cuidado breve das lembranças
que no centro de si vagueiam
doces, fluidas e cândidas,
e pelos sorrisos espelham
o que o Mundo não alcança

Oh! Que bom é ser criança...


(pintura de Claude Renoir)

Poema in "Transparência de Ser"